Inconformado pela
constatação de que não poderia permanecer de um modo são em um lugar sem
dimensão nenhuma, fez o carro rodar mais um pouco. O
pensamento rápido lhe passou pela cabeça enquanto acelerava, mas devagar.
Só restou a ele
perambular pelas ruas com seu carro ouvindo heavy-metal.
Indiferente ao rancor e
ao desdém dos habitantes dos passeios e das faixas de segurança para com sua
forma de presença. (Avançou o sinal vermelho...)
Sua mente estava em um
amplo grande-pequeno lugar sem
nenhuma cor, mas que pela força da impossibilidade de se imaginar tal locação
desprovida de tudo, ou seja, o nada real, ele imaginava-o todo branco, mas se
esforçava em ter a conotação de consciência que aquilo era cor-nenhuma, era um nada incolor, que pela medida da distância
imponderável, poderia denotar branco pela simples conclusão ad-infinito da
sem-referência localização.
No “salão incolor branco” com seu carro ele
finalmente não sabia se estava parado ou se movendo, desligando o motor e
descendo do carro, de pé fora dele, não podia saber se estava caindo ou
subindo, mas de uma forma como queria se impor a lógica, pensava que
provavelmente estava caindo, e é diante disso que surge a primeira duvida
maior:
Em um nada sem referência,
como poderia a mente saber se o corpo estava se movendo ou parado?
E outras questões:
Como saber o tamanho
daquele local? Era infinito ou era delimitado? Seria esférico ou disforme?
Haveria oxigênio ali? Etc.
De pé fora do carro,
vento nenhum se movia implicando queda, não havia vertigem, então os fatos dos
sentidos só existem se houverem pontos de referência para se comparar? Eis aí
se impondo a velha relatividade, mas não pertencia ela àquela situação!
Estava no local
não-local desprovido de intermediações. Não havia nada e aquilo ali poderia ser
um cômodo de 4 por 4 que ele nunca saberia dizer qual era sua dimensão. Nunca
alcançaria seu limite, pois não havia a possibilidade do movimento, ou o
movimento era tão constante entre ele e o carro a um metro de distância que
ambos decaiam ou ascendiam com a mesma inércia.
Um súbito susto o
alarmou,
afinal havia então dois pontos, ele e o carro, e poderia então medir distâncias
pelo ponto fixo. Deu uma volta no carro e ao completar o percurso pasmou com
mais uma coisa notada, o tempo que levou para percorrer a distância, ele não
saberia dizer quanto tempo foi, se foi 30 segundos, se foi um século, alguma
coisa decaia em sua mente, talvez a própria propriedade de perceber as coisas,
ele estava sendo contaminado por algo, sentiu.
Depois daquele tempo
que estava ali ele sentiu
extremo cansaço, era um peso na mente & no corpo que o fizera ficar postado
enfim, sentiu distender na mente, mais precisamente em um lugar na cabeça que
não podia enxergar, é claro, de uma apreensão volitiva diferente, como nunca
sentira, era uma constatação, uma sensação, aquela como infecção, sua
consciência estava sendo desfeita.
Na
fuga dos parâmetros exteriores se decaia também noções interiores, tão próximas
que eram compreendidas como crenças, que transpassavam como pensamentos à
priori da mente, & foi como se uma bolha de sabão
estourasse: “pup!”
Estava desfeita a
realidade, ou melhor, estava desfeita qualquer conexão com o real, assim, em um
mínimo instante, como um “pupar”,
“pup!”, & ainda com um pouco de consciência ou razão na cabeça ele sentiu
que aquilo tinha sido “a cinco mil anos”,
pensou, “não!, ainda iria acontecer,
daqui a dez milhões de anos, de séculos, de anos, de segundo, de...”
“Uma pinóia!”, proferiu, insensível já. “Caracol!”. Riu, enlouquecendo, não havia nada ali, nem ele, nem
carro, nem nada, quase. Ainda reverberou, um pensamento, ou dois ou três: caracóis atravessando os espaços vazios
entre as galáxias, deixando um rastro de gosma em micro-diamantes
intergalácticos tão frios como o zero absoluto; então, o pensar final, a
última volição de nada presente, pensou: “Qaw lah qaw!” & “Epinoia!”.
Tudo estava consumado,
ele havia se salvado...