Tenho me detido a pensar todo o significado deste evento esportivo
ocorrido no Brasil chamado Jogos Olímpicos, tentando não me deixar levar pelo
frisson espetaculista tanto dos jogos como das festas de abertura e
encerramento.
Sou obrigado à primeira vista, admitir sobre a beleza e grandiosidade de
tudo que foi realizado, apesar das contradições que carregam a realização deste
evento que se revela no contraste entre os gastos com os jogos e a situação de
nossos sistemas públicos de cuidado com a população, saúde, ensino, segurança,
trabalho, etc. Porém não quero aqui dizer mais nenhum clichê acerca disso, tudo
está bem explicito e o brasileiro tem plena consciência disso tudo.
O que quero analisar é simplesmente a emergência de uma mensagem disso
tudo, qual é ela e se ela é realmente relevante para melhorar a situação do
Brasil e da humanidade de uma forma em geral.
Comecemos pela Abertura e Encerramento. A mensagem que saiu dali foi
como aquela que colhemos em novelas, jornais, etc., ou seja, foi-nos exposto um
conjunto de informação midiática direta a respeito de convivência e
sustentabilidade ecológica, entremeado como propagandas em revistas, com bela
fotografia. Não sei por completo a relevância disso para a consciência
nacional, tão dormente sobre as questões ecológicas, haja visto nosso gosto
recente pelo embate político em protestos à Esquerda e à Direita pelas ruas,
redes sociais e aparelhos jornalísticos.
É claro que o “espírito olímpico” politicamente correto não permite a
veiculação de protestos políticos em sua interface mundial para além da
tolerância da expressão dos atletas apátridas, mesmo porque isso já contempla a
critica capitalista contra os “inimigos” da tal democracia ocidental, que
tolera também as regras do Islamismo acerca às mulheres.
Crer que ocorreria um atentado terrorista nos Jogos faz parte da
dialética do medo dos países em guerra contra o terror, mas isso era impensável
de ocorrer, já que os Jogos Olímpicos é o momento das grandes nações brilhar
diante do mundo, dando seu recado de prosperidade e superioridade econômica e
política onde não mais o terror se infiltra, já que ele serve à essas nações
apenas como fator de união interna e justificação com gastos em armamentos.
Ao largo de tudo isso se introduziu o Brasil fazendo sua mea-culpa
ecológica e social nas festas de abertura/encerramento. Revela-se sobre tudo
isso o fato sincronístico da Rede Globo após o encerramento e a passagem da
bandeira olímpica ao Japão de veicular um filme onde se apresentava a bomba de
Nagasaki e a penetração do ocidente, na forma de um mutante violento e
carismático, na cultura nipônica.
Porém antes disso, a festa de congratulação debaixo de uma fria chuva de
fim de inverno, onde os atletas super-humanos eufóricos se misturaram com o
povo moreno e dionisíaco ao ritmo do samba revelou uma imagem do que pode ser a
“paz universal”, que eclipsa assim a realidade humana dos últimos tempos.
Tirando o mau estar imposto pela delegação da Oceania, dos boxeadores
africanos estupradores em potencial e o nadador norte-americano mentiroso, as
guerras de informação e imagem de choque de cultura, o grande perdedor desses
jogos foram a Rússia, que mesmo tolhida de sua delegação, muito por culpa
própria, mesmo assim terminando em quarto lugar no quadro de medalhas.
Penetra assim também nos Jogos o sentido para onde está se encaminhando
os conflitos internacionais dos próximos anos. Creio até que a Copa do Mundo de
futebol será tirada da Rússia e dada ao EUA.
Voltando à uma tal mensagem desses Jogos, o que o Brasil pode tirar
deles, carregados ao nível arquetípico, podemos observar a revelação pública do
cinismo político exemplificado nas atitudes do prefeito da cidade do Rio de
Janeiro. Há também o embate ideológico do legado político dos Jogos que
escorreu entre os dedos do PT na forma da areia fina dos cartazinhos ridículos
de “Fora Temer” nas mãos de adultos e crianças e principalmente a ausência de
qualquer cartaz de “Fora PT” ou “Fora Dilma”, isso porque na mente nacional
talvez “Fora Temer” queira dizer justamente “Fora Dilma/PT/PSDB/PCdoB/PMDB/DEM”
etc.
No mais, as Olimpíadas são justamente o espaço de quatro anos entre cada
Jogos Olímpicos, assim, agora findados os Jogos, o Brasil retorna iniciado na
recepção do evento, fazendo parte das nações que sediaram os jogos em si, que
são símbolos da confraternização universal imiscuídos do critério de competir
em vez de guerrear, assim provavelmente teremos que fazer como todos as grandes
do ocidente e do oriente que receberam os jogos, salvo raras exceções, de não
mais lutarmos contra um inimigo externo, mas travarmos nossa guerra interna,
que já se revela no horizonte nos últimos anos.
Depois de descarregarmos para o mundo nossa tensão de “vira-lata na
via-láctea”, como captou Tom Zé em seu último CD, agora rumamos para fazer
nossos ajustes de contas internos. Provamos a nós mesmos, de forma passiva,
pois recebemos a mensagem pronta dos organizadores dos jogos, que o poder o
“espírito olímpico” pode realmente conduzir à “união universal”, e vamos agora
suturar as feridas de nossa desunião interna.
Os Jogos provaram ser mais fortes que qualquer Internacional, mais
eficaz que qualquer manifestação política, mais sutil que qualquer guerra, mais
profundo que qualquer domínio cultural, pois fala de superação, não de
submissão. É claro que esses parâmetros estão em construção ainda em nossa
sociedade, estão se desenvolvendo, mas tem agora que passar pelo teste
histórico de ser tomado pelas mãos do povo e não apenas ser conduzido insone
por políticos engravatados exilados da realidade pelo fascínio do espetáculo da
grande política, da grande corrupção, da grande cisão do pensamento que há
entre verdade empírica e teoria, analise e discurso politiqueiro.
A Olimpíada do Rio 2016 revelou a possibilidade do povo brasileiro se
descolar do espetaculismo fantasioso de nossa mediocridade cultural e política
e erguer, com suor, mas não porque com o sangue necessário que clama Justiça, e
começarmos a construir verdadeiramente uma civilização tropical, para além de
caetanos boçais e tais, heróis 100% banais, calarmos discursos virais ou pseudo-intelectuais,
e nos unirmos sob o símbolo que ficou depois dos jogos, que são os próximos
quatro anos olímpicos que começam por uma faxina eleitoral e consciente em
nossa própria casa, nosso bairro e cidade.
Não podemos perder essa oportunidade. Assim como a festa de encerramento
dos Jogos convocou os artistas, os poetas, os paisagistas, para revelar sua
mensagem de cor, som e movimento, saiamos todos da caverna de nossa própria
pré-história e adentremos enfim no mundo civilizado que propomos ao nosso próprio
modo: solar, fractal, indócil, mas amoroso, e na manhã fria depois da ressaca
da festa, miremos nos valores nacionais onde o maior é justamente a pessoa
comum.
De nossas 19 medalhas, 14 foram de talentos individuais, 3 foram de
duplas e 2 de equipes, dito esporte coletivo. Dos talentos individuais todos
foram casos de superação pessoal e/ou social, porém houveram outros casos, que
por não ganharem medalhas ficam esquecido do espetáculo, que é o caso por
exemplo do sétimo lugar no Mountain Bike, ou o quinto lugar da ginástica na
trave, etc.
Tudo isso prova que o melhor do Brasil, foi e sempre será, o povo
brasileiro, o cidadão comum. Que esses Jogos sirvam para despertar a
auto-estima em nossos corações e que conquistar um lugar ao Sol significa muito
mais do que se corromper, pisar no mais fraco, obliterar os demais, significa
trazer a sua luz e calor para junto dos demais.
Nessa manhã e dia frio na ressaca pós-jogos, saibamos buscar a vitória
para dividir entre todos!