27 de fev. de 2022
25 de fev. de 2022
Destrilha
Você sabe
que coleciono
simulações suas
Dispersas por entre as teias
& os túneis
por onde teus pés magros & brancos
fincam passos cravos
como se fossem minha carne
& caldo de memória...
Nesses tempos áridos
parto do cançasso & da exaustão
para falar desse desejo
& amor
Onde você, na sela do dragão,
cavalga na trilha do sopro vermelho
extinguindo inconsciente
o rastro de qualquer mera paixão
surgida no sono da noite
onde me extinguo...
21 de fev. de 2022
Migração
alucina-se
Tua sombra dança em volta de ti
longe-vai...
monte
Tempo-Espaço-Abismo
cratera
O sol
A terra
A árvore
Não há nada fixo
Acima ou Abaixo
Fluxo, refluxo, empuxo, dispersão
Tua sombra não dança em torno de ti
Está tudo em migração
Rumo ao exílio
Tudo dança diante de ti
menos a sombra, em fim...
19 de fev. de 2022
Nova Era Glacial
Já era... o calor...
Por mais que se ande quente pelas ruas
Em atrito com asfalto negro
Jurássico & poluente
Por mais que chova
Ácido do céu
& euforia eleitoral
Pela rede social
Por mais que a seleção entre em campo
& as pessoas marchem
Por isso & o seu contrário amplo
Por mais que se some
Centígrados aos milímetros
Por mais que explodam vulcões
& manchas polulem no sol
Expelindo lava sideral
A distância sugerida entre os corpos
As máscaras ressentidas pelas faces
A fria agulha com placebo entre a pele
É por onde entra o frio no coração
& sai o gelo da opressão
Agora se aqueça com o contato à distância
Com o calor do micro-ondas
Com a segurança do passaporte pela própria terra
Com os funerais relâmpagos
Com as festas de bote salva-vidas
Com a educação virtual
Com a balada do lockdown
& o descanso da quarentena
Enquanto se instala desde o coração
A nova era glacial
16 de fev. de 2022
Ousadia I & II
Posso não me interessar em você
por corpo ou forma,
Mas com certeza me interessaria
em perversão...
Na comunhão de um desvio
ou do prazer por via do obscuro em nós,
Insondável à luz do sol
& longe das colunas social ou moral,
Por debaixo das pedras que não rolam
& na sombra impenetrável dos atos;
Posso te amar & te querer
de corpo e na forma
Do azougue que pesa & contamina,
do vinho que entorna & lava pudores,
Da mácula imperdoável
de um rancor que por hora se esquece,
Na benesse da gratuidade
de um encontro casual,
No lento & longo ranger de vísceras
em fome insaciável que só se extirpa
No conluio da perversão
que não se torna vício, mas concessão;
& que em tudo nessa latência
de nossa temeridade, chamemos de ardor!
Porque nós somos o lobo
& o verme que tudo come
Somos os restos
do que não se consome
Somos o homem, o que some
& já sentimos a morte
antes que ela nos tome
Somos o que some
aos poucos, no sono
Somos o que se levantou
& agora tomba
Insultados pelo que desejamos
& sem forças para a selvageria
Somos passado
& mais, talvez presentes abandonados
Somos futuros cadáveres
que ainda comem o que vê
Mas já não toca
o que há para outros ter
& já vamos
deixando as feridas em forma de beijo
Nos corpos que tocamos
& nos que nos foram negados
Porque nós somos o verme
& o lobo que tudo come
11 de fev. de 2022
A Longa Retirada
Longa retirada
través do sertão vazio
que cerca o mundo
O mundo mesmo é cerca
cessão & barreira
que represa em separado coisas a não se misturarem
Os pés ponteiam passos
traços pontos esparsos
no vão abismo entre as coisas
Vamos vivendo
de salto em salto, queda em queda
no desamparo do viraser
Longa retirada
em breve perpetração
no vazio sertão ocaso & caso de tudo
9 de fev. de 2022
Soter
Tal qual água
Que cai de alturas improváveis
O espírito desceu
pelo negror da noite eterna
Entre a Luz
& o peso da matéria...
Destemidos como os animais
Que entram na noite para caçar
Nosso espírito veio ao mundo
na busca de ser deus,
O prêmio pela coragem
de conhecer o que lhe é impossível
A dor, a fome, a morte
o amor...
Tal qual nuvem
Que se ergue do peso do chão
O espírito sobe
pelo negror da noite redimida
Entre a Matéria
& a leveza da luz...
7 de fev. de 2022
fio
...não falar da manhã
& o que ela arrasta para vida
mais um dia, depois de outros
& milhares de outros mais
que não são mais manhãs
ou dias
nem memória
são apenas um longo fio de tempo
que fiam-se no semi-esquecimento...
...de lá não sobra
o que sobra sou eu
preso ao presente
que ninguém recebe
mais uma aurora
alvoroço a se reinventar
um motivo ou dois
para tecer de novo
o dia, fio do esquecer...
4 de fev. de 2022
Arché
Um olhar real sobre a natureza & suas manifestações, vemos que ela alucina & transborda uma alegria criativa indolente...
A única coisa enfadonha é o ser humano, rebelde ao inverso, sério & arrogante, idiota & superficial, assume o arquétipo do tolo cego, demiurgo...
O ser humano é pior ainda quando se deslumbra, porque o faz com o que não existe, renegando o que é real, & sempre enganado, por si mesmo ou outro velhaco...
Sua fé ou a falta dela é cavalo de batalha, o que assume ou o que renega o faz como circo, como feira, mergulhado na Cultura Stand-Up, na Espiritualidade To-Mega-Agnoia, na obscuridade em meio ao mundo...
Mas... ainda há o pó da senda na sola dos pés-raizes dos que Caminham... deserdados de uma irrisória herança dos séculos, milênios, onde o que ficou para trás foi a carnificina da ignorância, atravessada na penumbra pela luz da Gnose...