26 de nov. de 2024

Eterno Retorno

 

Eterno retorno...
   O Eterno Retorno é sintoma de algo perfeito que se quebrou.
   Aqui nós, em luta incontrolável contra o já acontecido na angústia esperançosa de algo novo... mas o que "novo"? O "de novo"!?!?
   O sempre aqui do que nunca se foi & sempre será. Treme minhas pernas & o chão sob elas que chacoalha para impulsionar também o mesmo lugar...
   Não há conjunturas. Não há acasos, causalidades definidas, artifícios sintetizados, etc.
   Fico a pensar na "primeira vez". A vez fundante de tudo isso, a primeira vez que aconteceu o que depois seria eternamente repetido.
   Não houve então a "primeira vez que aconteceu", mas sim o inevitável devir do que devia ser por toda a eternidade que em sua essência seria retornável, encaixando, escorrendo pelas mesmas "frestas trincadas absolutas" do espaço-tempo abertas desde todo sempre, para depois de atravessado, tornar a retornar por essa fresta, essa falha aberta...
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   Uma tal falha aberta como cria-ação numa outrora imutável perfeição harmônica que rompeu, rachou... & que só podia resultar uma coisa a ser para sempre repetida como um "filme" da produção dos Estúdios Demiurgo S.A., que disparou para sempre os ciclos de ação por toda o Nada rompido (não se sabe se localmente ou em uma tal abrangente totalidade), aberto como Espaço, ciclos esses conhecido como Tempo.
   Por isso o terno retorno é o sintoma de algo perfeito que se quebrou.
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   O eterno retorno só pode ser então, o retorno do que devia ser, do que só podia ser...
   Não há então "luta", e por que deveria haver "esperança" ou mesmo "angustia"? Se "apenas" passamos (& repassamos) re-ternamente pelo torno da mesma configuração única possível por onde passar, como em um filtro de pedra com um só caminho fendido em si, como dobras & rasgos, filamentos congelados ou concretados no tecido quântico do universo por onde desliza-se o que é, que foi & que será!
Retorno eterno...



24 de nov. de 2024

(24/11/24)

 

         Quando não é o tempo que se esgota
         Mas o clima que extrapola
...ontem
   nem toda festa
   nem toda dor
   todo sono
   ou euforia...
Evitou alguém
   de partir!
         Não é a causalidade que age
         Mas a fatalidade que abate
...hoje
   nem todas as horas
   nem todo tempo perdido
   todos os sábados passados
   ou os domingos que virão...
Faz alguém
   ficar!
         Momentos que passamos na farra
         Mas a vibração é de tristeza
...amanhã
   nem toda chuva
   nem todas as ruas
   toda noite escura
   ou néon acesso...
Fará alguém
   voltar!
         São banalidades coletivas vividas
         Enquanto tragédias pessoais sucumbem
...nunca
   água alguma
   ar algum
   quer faltem
   quer sobrem
Acrescentará nada ou ninguém
   no aberto que não se fechará!



23 de nov. de 2024

Vesúvio

 

Chuva ácida nas vísceras
A fome incomoda toda hora
   & todas as hortas, chiqueiros
      currais, alcovas
         não surtem crias que saciem...

Eu aplaco o fosso
Enchendo o nariz de terra
   a mesma terra em pó
      donde brotou a planta que anda
         & que vem até mim
            enquanto também vou...

Reviro o fundo das coisas
   com o remedo da fúria elétrica
Enchendo os olhos de vidro
   que solidificaram do magma
      que escorreu de mim
Pelos poros, pelas lágrimas
   pelo gozo & outros vulcões...



21 de nov. de 2024

A Noite Também Se Levanta

 

Enquanto todos olham
   para o pôr-do-sol
A noite também como o dia
   vem do Leste...

A noite
   vem de lá
Do mesmo lugar
   que o sol nasceu...

A noite também se levanta
   & vem pelas costas
De quem olha o sol
   se ir à Oeste...

& se invertem
   nossos sentimentos
O que era riso do dia
   se torna receio do breu...

Pois o sol nasce pelos olhos
   & a noite pela dorçal
Essa abre abismos
   & aquele preenche os vãos...



20 de nov. de 2024

Bela & Estranha Noite

 

Bela & estranha noite
   onde quebro a regra & a exceção...
Saio para variar o aprisionamento
   & passo por lugares-covas de lembranças
      passo por lugares-comuns
         & vejo fantasmas do futuro
            que não me assombram mais...
& pelas ruas, nos bares
   celebro só todas minhas companhias...
As que me fazem falta
   & as com que estou feliz
      por não estarem aqui...
Estranha & bela noite
   onde ratifico a exceção & a regra
Do escuro que me recolhe
   do brilho fugaz
      dos olhos de quem negaram me ver
         & dos braços que me recusaram...
Da lembrança que esqueceu de mim
   & da que lembrou
      depois que esqueci...
Pelos bares ares de um será
   que nunca foi
      & não tornará...
Na bela & estranha noite
   que me fez feliz
      te ignorar...



16 de nov. de 2024

Coágulo

 

...coágulo espesso no meio de tudo...
Seu peso causa atração
   Atração causa tempo que acrescenta ou esvai

Gravitamos inertes ou em espasmos
   Em volta do fulcro
Há lutas imaginárias acontecendo
   & embates reais a se travar

...o coágulo se expande...
Agrega alegria vivída
   & rancor de morte

As pessoas habitam suas lamúrias
   As pessoas casam com suas descrenças
Animais impassíveis com medo de tudo
   Animais irrascíveis com credos de tolos

...o coágulo se contraí...
Execra pânico em orações
   Defeca discórdia em atos banais

Afundamos em descaminho verticais
   Nossa insanidade natural exposta em público
Nos perdemos achando saber onde estamos
   & tudo é um ensaio do inferno que vivemos tentando fugir

...o coágulo nos põe em lugar comum...
Somos aproximados do que queremos fugir
   Qualquer companhia humana é o que sempre temos que superar



14 de nov. de 2024

Símiles

 

as palavras todas prontas
   & o silêncio armado
os sentimentos experimentados
   & a indiferença afiada
as situações revividas
   & o irrealizado surpreendendo
os atos repassados
   & as fugas recortadas
nessa espera longínqua
   pela graça que nunca desaba sobre nós
um aprendiz de decepções
   na escola da morte da solidão
o coração encouraçado
   já nem bate mais
mas as palavras... já estão prontas



12 de nov. de 2024

Álgebra

 

Vislumbrei o resultado da equação
   da conta que ninguém faz...

Somando para diminuir
Subtraindo para aumentar
Dividindo para harmonizar
Multiplicando para simplicicar

Nessa fórmula
   onde as contas não fecham nunca
Uma quinta operação para as incertezas
   anular & plenificar

Um quinto elemento da natureza
Uma quarta parede do cotidiano
Um terceiro sexo à se considerar
Uma segunda opção para descartar
Um primeiro contato à cada dia
Um caminho do meio em todas as considerações

Vislumbrei o resultado da equação
   da conta que ninguém faz
As proporções do amor
   que pesam, apreciam, avaliam,
      solucionam & complicam
O afeto disposto
   ao longo do tempo & espaço
      na métrica & na proporção dos corpos
         & na obscuridade
            & imponderabilidade do espírito
Resolvido sem se definir
   & é assim que é
      em probabilidade & liberdade
A contagem, soma & diminuição
   de carne ferida, ossos quebrados
      & coração partidos...



10 de nov. de 2024

Revoada

 

Pássaros se arrastam
   aos pés dos muros
Eles batem nas paredes
   eles beijam o chão
& ciscam nas migalhas
   que vieram no vento que outrora voaram...

São aves, são anjos, são pássaros
   são nossos sonhos de voar
São nossas asas cortadas
   que se arrastam agora sem céu
      sem lua, sem vento, sem mar
Beijando os muros, lambendo o chão
   vivendo de restos, são sobras também
De nossos desejos com as asas cortadas...

Pessoas que se arrastam
    aos pés dos outros
Batendo a cara na parede
   beijando a lona & a sarjeta
& não sobram nem restos
   de voos ou quedas de paixão...

São santos pecadores, são aves marias
   são pássaros que passarão
      são anjos que caíram
         aves manias de paixão
Revoada de esperança que ainda insistem
   & mordiscam as migalhas no chão...



9 de nov. de 2024

Fera

 

Saia para selva fera
   não esqueça de afiar as garras
A fome é um estímulo
   a fome sempre foi o grande estímulo
Ao contrário dos homens que comem
   & se apegam ao poder
Os fracos
   são a carne dos fortes

Saia para noite moça
   não esqueça de esconder a vergonha
Você pensa estar em segurança
    ao lado de predadores doentes
Quem caça são eles ou você?
   a presa é o corpo ou o prazer?
A fome
   é um interlúdio da caça

Saia para a caça omça
   mantenha as presas afiadas
É pela boca que vive
   pela boca que morre
Não há trocas justas
   quando temos interesses tão diferentes
A força
   é o espírito dos fracos



8 de nov. de 2024

Estante/Instante

 

Na estante
   uma tonelada de palavras no papel
Eu fico pensando:
   -Todas passaram por mim...

& agora? Onde estão a maioria delas?
Fantasmas que me atravessaram
   como átomos livres
& partiram para lugar algum...

Ideias transportadas
   na velocidade da luz
Muitas meus olhos deteram
   & poucas repousaram na mente...

Matéria viva, matéria escura
   matéria palavra-ideia que me compõe
Material achado & perdido
   na estante-instante eterna
      de meu passar os olhos & ler...



5 de nov. de 2024

Fundo

 

Nós que permanecemos no fundo
   da sala, dos bares, da fila, do mundo
Vemos tudo à distância
   a chuva, o sol, a aula, a vida
      nossa & dos outros
         como um teatro
            a nos entreter ou aborrecer...

Depois do show os aplausos
   os flashs, as vaias
      um rabisco num caderno de recordações
         um risco na memória de quem passou
Um drama ao que sobrevivemos
   ou assistimos os outros passarem...

Nós que nos entretemos já
   mais com o copo que com o corpo
Com nossa visão já
   acostumada ao escuro
Enviamos missivas de lágrimas
   de alegria & tristeza
      para os que estão à distância...

Depois do sol a chuva
   & depois da chuva o frio
Vem inverno & primavera
   o sucesso da maçã
      & a sucessão de decepção
& nós no fundo
   acostumados à escuridão...



4 de nov. de 2024

Pandora

 

Procurar desvendar o mistério
   de outra pessoa
É apenas conhecer
   sua insanidade...

Estamos entre estranh@s
   com seus mistérios
Tão fechados
   como abertos
Guardando nossa loucura
   como personalidade
Revelando nossos mistérios
   como decepção

Pessoas iguais
   à caixas fechadas
Os mal, ou bem aventurados
   amaldiçoados, defeituosos
Os trincados
   por onde nossa luz sai & entra

Estamos entre estranh@s
   & falta tão pouco para tudo se desvendar
& é tão desconcertante
   a verdade de cada um
Dita sóbria ou ébria na cara um dos outros
   que faz do amor o veneno mais fraco
      guardado no fundo da caixa do peito...



2 de nov. de 2024

Apêndices

 

Os mosquitos adoram meu sangue
É seu alimento & comunhão com vampiros maiores

As larvas habitam minhas feridas
& procrastinam a cura da minha carne

As bactérias amam minha pele
& dela exalam aromas que flor nenhuma tem

Os demônios se apegam aos meus pensamentos
& me fazem porta-voz para o silêncio dos infernos

Os anjos se entretém com minha sina
Em voos de queda & ascensão na matéria imperfeita

& você se apega ao nada que sou
Esperando sossegada que eu seja como os outros

Minhas palavras atraem antivaticinios
Que não se cumprem sem se cumprir

Minhas visões cegam futuros
Que eu próprio desfiz para mim

Meu atos anulam certezas
Que se fossem outros ao certo desejariam

& ao que me entrego é só o fado que não carrego
Pois já aprendi o que é existir

As maiores ilusões de minha vida
Eu pago com realidades mortais

A nuvens chovem sobre mim
& eu me escondo ao ar livre

O sol projeta minha sombra no abismo
& eu a recolho na lua cheia

A terra é minha testemunha
& persigo novos álibis para meus pecados

Penetro nas multidões
Para confirmar que não faço parte delas

Extraio a seiva de limbo dos meus apêndices
Secretando minha fraca rebeldia & raso aniquilamento







1 de nov. de 2024

Diáspora

 

 "Um exilado está em três condições
no mundo, e só tem dois lugares neste
mesmo mundo que lhe pertencem:
aquele espaço pleno dentro de um
abraço, ou o lugar oco de sua tumba.
   Assim o exilado é um ser amado ou
um cadáver, ou é um degradado só.
   Então, de resto, enquanto vivo, solto &
sem ser amado, um exilado é apenas
um proscrito, um desterrado, & assim
se sente, única forma que o identifica
a "imagem & semelhança do Deus",
ou seja, um Abortado".
(Ednael VidgDharma)


Agora meu corpo é dois
São muitos
E mais...
Faz parte de um despovo, inmultidão
Nação dos desamados
Dentro do tempo & do pasto
E mais...

Agora parto como todos & ninguém
Para uma terra que não é a minha
Sempre estrangeiro
Cada átomo, cada órgão, um aborto
Sou parte de um povo que se desprendeu

Cada pedaço meu padece de saudade
Sem ao menos saber onde pisei
Porque saber também é amar & ser amado
No meio-chão que é seu

Eu vago perdido por entre fronteiras
Por paragens que nunca me mereceram
Não fui reconhecido em nenhum lugar
& por isso carrego comigo meu lar

Estou longe em cada porto
Me pego desejando o naufrágio
Não vejo saídas em aeroportos
Não será melhor para onde quer que for

Eu só sonho com um outro corpo
Que prove que meu lugar é em um enlace
Um homem não precisa de mais para ser feliz
Que o espaço de um abraço