The Origin of
Consciousness in the Breakdown of the Bicameral Mind
(“A Origem da
Consciência na Ruptura da Mente Bicameral”)
de Julian
Jaynes
“A Localização
da Consciência”
(pág.50 e ss.)
A falácia final que analisarei é importante e interessante; a deixei
para o final porque creio que dá o tiro de misericórdia na teoria comum da
consciência. Onde é o lugar da consciência?
Todo mundo ou quase todo mundo tem como resposta à isso: na cabeça. Isto
se deve a que quando introspectamos parece que buscamos ali dentro ver um
espaço interno, situado atrás dos olhos. Mas o que queremos dizer com ver ou
buscar? Às vezes até fechamos os olhos para observar os pensamentos, para
introspectar com mais clareza. Introspectar o que? Esta índole espacial parece
inquestionável. Todavia, parece que avançamos quando menos “vemos” em
diferentes direções. E se esforçamos muito para caracterizar mais este espaço
(apesar de seu conteúdo imaginado), sentimos uma vaga irritação, como se
houvesse algo que não quisera ser conhecido, uma qualidade que resulta ser
desagradável indagar sobre, como, digamos, uma atitude rude em um lugar
amistoso.
E não nos basta situar este espaço da consciência em nossa cabeça, supomos
que aí está no caso das demais pessoas. Ao falar com um amigo mantemos um
contato periódico olho a olho (esse vestígio de nosso passado de primatas em
que o contato olho a olho se relacionava com o estabelecimento de hierarquias
tribais), e sempre supomos que há um espaço detrás dos olhos do nosso
interlocutor, similar ao espaço que imaginamos haver em nossas cabeças, do qual
vêm o que dizemos.
E este é o verdadeiro centro da questão, porque sabemos perfeitamente
que não há nenhum espaço dentro da cabeça. Na cabeça não há outra coisa que
tecidos fisiológicos de um tipo ou de outro. O que seja predominantemente
neurológico não tem importância.
Não é fácil nos habituarmos à este pensamento. Significa que
continuamente estamos inventando estes espaços em nossa cabeça e nas dos
demais, sabendo bem que anatomicamente não existem; a localização destes
“espaços’ é de todo arbitrária. Os escritos aristotélicos, por exemplo, situam
a consciência ou a morada do pensamento precisamente em cima do coração;
segundo este pensador, o cérebro não era outra coisa a não ser um simples órgão
refrigerador, pois era insensível ao toque e às lesões. E muitos leitores não
lhe tiraram sentido nesta analise porque situam seu pensamento em algum lugar
da parte superior do peito. Sem embargo, para a maioria de nós está tão
arraigado o hábito de situar o pensar na cabeça que seria difícil pôr-lo em
outra parte. Mas, em verdade, você poderia ficar onde está e situar igualmente
sua consciência no ambiente em volta, junto à parede e perto do piso, e
realizar seu pensar ali tão bem como o faz em sua cabeça. Bem, não tão bem
porque há importantes razões para situar nossa mente-espaço dentro de nós,
razões que tem a ver com a volição e as sensações internas, com a relação de
nosso corpo e nosso “eu”, as que serão mais destacadas conforme avancemos em
nossa investigação.
Que não exista necessidade fenomenológica de localizar a consciência no
cérebro é uma tese que vêm a reforçar alguns exemplos anormais, no que parece
que a consciência está fora do corpo. Um amigo meu que recebeu uma lesão
frontal na parte esquerda do cérebro recobrou a consciência localizando-se
eufórico em um lugar do teto de um hospital, de onde podia ver-se a si mesmo
deitado em um leito e envolto em bandagens. Os que consumiram a dietilamida do
ácido lisérgico (LSD) falam de experiência fora do corpo, ou exosomáticas, que
é seu nome. Coisas como estas não indicam nada metafísico, simplesmente indica
que localizar o lugar da consciência pode resultar arbitrário.
Mas não tomemos conclusões errôneas. Quando estou consciente, sem duvida
estou usando sempre partes de meu cérebro, que estão dentro de minha cabeça.
Mas o mesmo ocorre quando ando de bicicleta, se bem que o andar na bicicleta
não ocorre dentro de minha cabeça. Os exemplos são diferentes, claro, porque
andar na bicicleta ocorre em uma localização geográfica, o que não se sucede
com a consciência. Na realidade, a consciência não tem localização nenhuma,
exceto quando imaginamos que tenha.
(tradução e.m.t)