16 de fev. de 2022

Ousadia I & II

 

Posso não me interessar em você
   por corpo ou forma,
Mas com certeza me interessaria
   em perversão...
Na comunhão de um desvio
   ou do prazer por via do obscuro em nós,
Insondável à luz do sol
   & longe das colunas social ou moral,
Por debaixo das pedras que não rolam
   & na sombra impenetrável dos atos;
Posso te amar & te querer
   de corpo e na forma
Do azougue que pesa & contamina,
   do vinho que entorna & lava pudores,
Da mácula imperdoável
   de um rancor que por hora se esquece,
Na benesse da gratuidade
   de um encontro casual,
No lento & longo ranger de vísceras
   em fome insaciável que só se extirpa
No conluio da perversão
   que não se torna vício, mas concessão;
& que em tudo nessa latência
   de nossa temeridade, chamemos de ardor!

Porque nós somos o lobo
& o verme que tudo come
Somos os restos
    do que não se consome
Somos o homem, o que some
& já sentimos a morte
   antes que ela nos tome
Somos o que some
   aos poucos, no sono
Somos o que se levantou
   & agora tomba
Insultados pelo que desejamos
   & sem forças para a selvageria
Somos passado
    & mais, talvez presentes abandonados
Somos futuros cadáveres
   que ainda comem o que vê
Mas já não toca
   o que há para outros ter
& já vamos
   deixando as feridas em forma de beijo
Nos corpos que tocamos
   & nos que nos foram negados
Porque nós somos o verme
   & o lobo que tudo come







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