10 de jan. de 2011

Felicidade



Certas coisas insistem em querer me dizer que no passado existiu a felicidade...
Certas coisas insistem em me dizer: a felicidade já esteve por aqui...
Nessas paragens dos mandriões insuperáveis
   coisas sim, coisas não, apontam para o passado,
      & de lá clamam que a felicidade existia...


Eu reviro fotografias amareladas pela luz dos tempos em que elas ficaram escondidas,
   no escuro dos fundos das gavetas de armários criadouros de mofo;
Eu as vejo, eu ouço o silêncio daqueles mortos, daqueles idos,
   daqueles que agora estão indo,
Eu reparo na imobilidade silenciosa do segredo mudo que eles guardam,
   como fuga do passado - os que não pereceram fugiram para o agora -
E agora eles guardam o segredos de suas magoas, de seus não mal resolvidos,
   dos seus sim arrependidos, do seus nuncas que nunca permaneceram...
Eu revivo esses arquivos mortos e moribundos do passado
      e não ouço deles saudades do futuro, não sinto inveja deles - mentira -

Certas coisas insistem em não querer me dizer toda verdade,
Que a felicidade está sempre sendo perseguida,
   clamando por ser encontrada
      ela indecentemente se esconde diante dos nossos pudores
Nossos clamorosos pudores de tempo & espaço,
Nossos pudores não revelados de ressentimento
   do tempo & do espaço,

Inocentes são de nossas derrotas eternizadas na progressão das fotografias,
Perdemos-nos para a vida, nos ganhamos a morte,
Ganhamos-nos tempo e perdemos tanto
Perdemos como quem joga sementes em campos de pedras,
Nós perdemos na medida em que não sabemos perder...

Certas coisas insistem em querer me dizer que no passado existiu a felicidade...

Existia como sossego
- mas os anjos não nos contaram que qualquer sossego sempre acaba;
Existia como simplicidade
- mas não aprendemos com ela
   e não a guardamos para horas que as complicações florescessem;
Existia como infância
-mas dos mais ledos enganos, o engano da infância é o maior
   porque ela só acaba para quem criança deixa de ser;

Existia a felicidade como uma quase solidão,
   a felicidade existia como uma pré-dispersão,
...e nossos bisavós e nossos avós e nossos pais
    preferiram o ataque ao cerne do fascínio do progresso lúgubre do concreto
      do que a resignação nas imediações das charnecas prodigiosas de seus quintais...


A felicidade se afasta de nosso mundo na medida em que os quintais são cimentados...
A felicidade desiste de nós cada vez que um motivo próprio para nascer
   é superado por um motivo alheio para morrer...
A felicidade está cada vez mais distante
   cada vez que distante no passado acreditamos que ela existiu...
Essa mentira é o controle que aterra os quintais, que desmembra as quinta,
   que embrutece o rústico e suaviza a dor de se querer o que está diante dos olhos!

Um comentário:

guru martins disse...

...viagem no
tempo e no espaço...

aquele abraço