28 de fev. de 2025

Carnaval

 

Vou sumir no Carnaval...
   no tempo que vendo, onde eu devo estar, vou lá para cumprir presença...
   mas é como se não estivesse lá...
   vou estar transparente, vou me fantasiar de ar...
Vou sumir no Carnaval...
   no tempo que é meu, onde quero estar, vou para lá negar a ausência...
   como se sempre estivesse lá...
   vou estar translúcido,  vou me fantasiar de mar...
Vou sumir no Carnaval...
   dizer "bye bye fevereiro, hello março", vou entrar no tempo suspenso do feriado...
   na escravidão & na liberdade...
   vou estar transpassado, vou me fantasiar de amar...



23 de fev. de 2025

Nó...

 

Fios tecidos de nada & caos
   De (i)matéria ocasional
Cordas, caminhos, fitas
   Desembocam em laços, enlaces, nós
Assim somos cada um de nós
   Nosso vínculo é sermos unidos & separados...

Emaranhados por si só
   & mediante de mais, de outros
Compartilhando a influência que fazemos
   Uns nos outros
Até não poder mais
   Saber onde começa ou acaba...

Uma reta que vai & encontra__ __
   Sua ponta ao final____
1 círculo que se torce
   & torna-se um 8
Que se contorce dentro & fora➰
   Em um nó infinito afinal...

Aperta & afrouxa
   Esse é o (des)sentido superficial
Há profundidade nos nós
   & os chamamos laços ou embaraços
Mas sempre esse caso
   É feito do que queremos unir ou enforcar...

A verdade é
   Que estamos enlaçados, não unidos
Transpassamos uns sobre os outros
   Como ruas, estradas, serpentes, fios
Coisas que não se misturam
   & no entanto temporariamente se abraçam...

Atados assim
   Até o nó se desfazer
Forças que atuam
   Atam, apertam, puxam, distendem, desatam
& vemos, não é vida, são só atos
   Coisas que nos fazem cordas retas & teias, nodo, fatos...

Até então nos dispensarmos
   Dispersando, desenlançando
Seguindo em frente
   Para então em outros lados
Encontrar novas cordas, cabos, chicotes
   Para enredar, prender, açoitar
& seguirmos nosso fado...



16 de fev. de 2025

(in)Esperado

 

Segue adiante
   está tudo atrás
      & mais ficará...
Veja por esse lado:
O que ficou
   pesa o mesmo
que o que virá...
Pesos mortos,
   pesos vivos
      tudo que fomos feitos
         para suportar...


Se o tempo não corresse demais
   conosco sempre seguindo seu rastro
Por entre os casos & acasos
   por entre os ocasos & nascentes
      de todas as causas
Se não corressemos também
   à procura de coisas que passaram...

Ir para frente
   sempre buscando coisas
      que ficaram para trás

Estamos eleitos no tempo
Por entre sono, sonhos, façanhas
Cautelosamente desesperados
   até a raiz das horas
As que se foram & as que virão
Estamos condenados a passar também
   sem não antes
      tudo passar por nós...

Seguir adiante
   sempre tentando estar
      onde não estamos mais

Adiante
   não se adia nada
Tudo tardia
   & o dia tem seu tanto incerto
      daquilo que vem para perdemos
Entre encontros & desencontros
   com hora marcada
      para não começar & sempre acabar...



14 de fev. de 2025

...hoje...

 

Somos Aqueles
Que Não Distinguem
Alvorada de Crepúsculo

...hoje é um dia daqueles!
      hoje quero ser testemunha da noite
   ir & ver
      o que está lá para acontecer...

...hoje o dia é maior
      & a noite será mais longa ainda
   quero ver tudo que se estende
      sobreviver para conhecer outro dia...

...pois hoje acordei em plena madrugada
      já antevendo a penumbra de outro dia
   não quero que reste lembranças
      quero que permaneça os desejos
   & se realizem as vontades
      antes de ver desfalecer
         na entrega do sono já dentro da aurora
   aquilo que, hoje..., levantamos para fazer...




12 de fev. de 2025

Gravissismo

 

Cem quilos de empuxo no fosso da gravidade
Os únicos movimentos conscientes
   são os da língua... & olha lá!

Ou dançando sobre os terremotos
Com os pés nas cabeças
   mais abalados pelo temor que pelo tremor!

Coração bate sem controle...
Para frente & para trás
   vamos nas mazelas da aceleração...
Para baixo, sempre
Para o alto, à alto custo...

Mas de vez em quando...
   no balanço das máquinas
   na inércia aleatória dos rumos
Sobre o tremor
   das pedras & emoções
Eu pareço flutuar
   mais leve que tudo... & todos...



10 de fev. de 2025

Anteparo

 

"Joga teu pesar no abismo!
Esquece, Homem!
Esquece, Homem!
Divina é a arte do esquecer!
Queres voar,
Queres habitar as alturas:
Joga o que mais te pesa no mar!
Eis o mar — joga-te no mar!
Divina é a arte do esquecer!"
(Nietzsche)


Desistir é uma benção
   ...o futuro telegrafando para o passado...
      ...memórias iminentes de decepção...
           ...& o desconforto em insistir...
                           ...no inútil...

Estamos só compensando
Estamos só substituindo
Estamos só cavando mais fundo
   um buraco sem saida
Modelando no barro & na pedra dura
   quinas arredondadas
      em coisas cortantes
     
O ponto de não retorno é uma lenda
   quando se trata de situações humanas
É um lema thanatológico
   que invade a mente vivente
Para invariavelmente dizer de outro modo
   que o fim virá
      & você continuará preso à coisa
         como um verme ao cadáver

Qual é a hora de parar?
Qual é o momento de dar um passo atrás?
Qual é a circunstância de deixar ir?
Você só vai saber
   quando fizer acontecer!



8 de fev. de 2025

Totus

 

Por muito tempo eu achei
   que era um homem incompleto...
A parte que falta... um pedaço de algo
   pedaço de pedra, de criança
   pedaço de monstro, pedaço de tolo
   um pedaço de nada...

Só tarde senti que nada me faltava
   nem a alegria nem a dor
   nem carne nem osso nem alma nem corpo
Não me faltava você
   nem outro alguém
Não me faltava um amor
   nem uma nêmesis
Não faltava ímpeto
   ou covardia
      para me expor ou esconder

O sentimento de falta em si
   é só fuga momentânea da solidão
Que não abraça mas dá as costas
   ao que sobra
      & clama, muda, à facilidade da frustação
Por muito tempo ignorei
   que era um homem completo
Pois confundia perfeição
   com totalização

Assim, eu, em constante reparação
   à cada ferida, cada lesão
Dos olhos ao coração
   cada corte fechado
   sanado, curado
no tempo certo
   de ser inteiro outra vez



   O sentimento de "incompletude" é uma espécie de assombro diante do absurdo do abismo pessoal, apavorante, pois se acha que não pode preencher tal abismo... & que nos convoca então à tarefa existencial de transmutar isso.
   Somos imperfeitos, porém potencialmente perfeitos, & se somos incompletos, nada tira nossa possibilidade de almejar & alcançar a Completude.
   De tal forma a "completude" é diferente da "perfeição". A completude é uma posição tomada na vida, de cultivar equilíbrio,  seja nas relações ou interiormente ao fim de ser alguém são, e não um desequilibrado.
   O abismo não precisa ser preenchido, pois ele perderia sua essência. Essa é nossa natureza & é total, não quando somos perfeitos, mas completos!



6 de fev. de 2025

Práxis

 

Com medo de olhar lá fora
...os olhos fogem, piscam,
      até acostumar com a claridade...
   sofrendo com a luz
É como os ouvidos
...escutando música nova
      com a mesma velha banda...
   temendo não gostar
É como o corpo
...procurando outro corpo
      a mesma forma de sempre com outros vazios...
   desejando lá dentro que fosse um corpo já conhecido
No estranho do que vem
...um futuro que pressagia
      & rompe com o passado...
   somos nós mesmos estranhos para nós
Tantos velhos desejos & traumas
...tantos furores & calmarias
      que nos surpreendemos com a vida...
   & no minuto seguinte está tudo normal



4 de fev. de 2025

Refolhar

 

Varrendo
   folhas caídas já secas
      de com  pon   do
& frutos despencados
   de cada galho agora seco
      do tronco até tocar o nada

Equilibra-se na queda
   tudo que a árvore
      já não precisa mais
Tudo que passou
   & foi suportado
      através da extensa estação que findou

É a força do vento
   é o peso da chuva
      que leva à queda
É a ação do ciclo
   é o adeus sem dizer
      que abre novos tempos

Eu mesmo
   uma folha caída
      várias artes & partes de mim decepadas
Eu mesmo
   um galho seco
      que reviverá na próxima estação


 

2 de fev. de 2025

Abantesma

 

O que reserva o dia
   é mais uma questão de onde estar
      do que ser!

Mas você é...
Você é um fantasma
   que aterroriza nos lugares
Você é uma aparição
   que assombra
      a si próprio...

Entidade que encarna
   no nada entre situações
Lidando com tudo
   que o dia traz
      & as noites não deixaram para trás...

No momento em que entra
   em contato com outras almas penadas
Materializa do limiar da insanidade
   o céu & o inferno
      onde estará...



1 de fev. de 2025

Rasgo

 

Eu moro na tempestade
Mas não no furor
   & sim na segurança de lá estar
Perto da fúria
   dentro do coração

Caminho escutando mortos
Nada do além
   mas nas canções que gosto
Todos que partiram tem lá sua perfeição

Meus dias são vagos
Menos por falta do que fazer
   & sim por não encontrar alguém que mereça
      eu dar meu tempo, minha atenção

Seguimos em frente
   com tecido da realidade rasgado
Em um instante quem seguia junto
   vai cada um
      para um lado diferente

Eu só me fio no causo aprendido
Que tudo passa
   & o que fica é só a banalidade
      impossível de se modificar

Realmente não me interessa
   nenhuma opinião alheia
Eu confio no lugar seguro
   dentro da tempestade
Ouvindo a transmissão da meia noite
   na frequência do grande meio dia

& sigo assim... menos inquieto
   mais sabendo o que quero
      o que devo querer...
Pois a realidade quando se rasga
   arranca o véu do que era passageiro...
& só fica
   a face eterna nua
      em estrondo permanente do trovão!