2 de dez. de 2025

Vɛřvŭŕå

 

Falo uma língua nova
Às vezes nela grito, escrevo, esqueço

Ela flui da interioridade, de uma anterior idade
Ou de uma posteridade procastinada

Eu falo em uma língua nova
Língua quase extinta de um homem só

O sânscrito dos sãos, o inglês dos anjos
Grego das egrégoras, português dos urgentes

Metalinguagem original
De meus sentimentos

Falo uma língua nova
Que reverbera o que vim para falar

Fala que não tem ouvidos para a escutar
Palavras que ainda irão ser encontradas

É a prosa da rosa, a poesia da ousia
Verve da fervura, canto dos encantos



1 de dez. de 2025

Placebo

 

Na manhã incendiada
   enquanto me curo dessa minha febre
      pelas próprias forças de meu corpo,
Pago o preço desse remédio barato
   que é abrir os olhos,
      mexer os músculos,
         negar a dor
            & seguir...

Ali fora
   novembro vai se despedindo
      em cada manhã queimando
Como se padecesse de incêndio
   tudo que ficou para trás
      enquanto os dias vão esquentando
         mais & mais...

Assim dezembro decide amanhecer
   & o ano entra no mês crepuscular
      ambos verão verões passar
& que os céus leve a febre
   em seu rubro clarear
      como o banho frio
         ameniza a cólera
            & desperta o corpo para o dia ultrapassar!



23 de nov. de 2025

Reverso

 

No meio do oceano
No barco de pedra
Com vento nas velas
Ele encontrou a ilha
& lá estava a máquina do tempo
Temporal, templária, templástica
No medo do oceano
As ondas reversas
No barco das perdas
O bardo inverso
A ilha desencontrada
De lugar & momento
Ele encontrou & desperdeu
Oceano dos anos
Barco dos arcos
Ilha da trilha
Que se entra & sai desencontrado
Na máquinal temposteridade
Alcançando passados & futuros
Inversos translados à bordo
Naufragados na areia
Da ampulheta reversada



19 de nov. de 2025

Simulacre

 

Talvez eu não esteja aqui
Talvez eu seja aquele
   que vive nos meus sonhos
Talvez alguns de mim
   sejam só simulação
& qual de nós vai saber
    qual de nós vai saborear?

Na distância
   nuvens que nunca tiveram outra igual
Mais longe ainda
   estrelas que sempre estiveram lá
Mesmo que não estejam mais...

Esse é o céu que nos (des)protege
Projeta no aberto & no vazio
   ao que nos abrimos
   & nos esvaziamos
Para lançar a semente
   da dúvida certa
Que talvez, tanto faz,
   estejamos ou não aqui!

Mas esse é o nosso grande momento
Essa grande farsa que temos que colaborar
   sendo sinceros na nossa mentira
& para além das nuvens
   além das estrelas
Nesse vazio cheio de nada
   que preenchemos de nós mesmos
A felicidade pode fluir
   da ferida aberta de existir...



16 de nov. de 2025

05h38

 

A luz da manhã
   gratuitamente me impõe
      um breve momento
         de sincera felicidade por dia
Eu quase desejo
   que o tempo pare
      para que eu habite
         naquele instante no espaço

& passo por ali
   no puro momento passageiro
      no meio da estrada
         à beira do caminho
Onde a felicidade é maior que a indiferença
   & muito maior que a tristeza
      a paisagem é estranhamente de vida
         & útero de esperança no tempo

Eu descobri porquê...
Nesse lugar, onde hoje a luz é mais bela
O ar é mais fresco
   & a vista límpida
Logo, mais adiante,
   quando não for mais verão ao sul
Ali é justamente o lugar mais frio
Com ar mais cortante
   & a paisagem mais escura



14 de nov. de 2025

Alinhamentos

 

Alinhamentos do nada & tudo a ver
A sua fome, minha vontade comer
A sua forma, o fato de te ter & poder

Uma nuvem à esmo na estratosfera
Risca no prumo de um fio aterrado
& faz sombra desde a atmosfera

Seu olhar cruza com o foco do que vejo
Eu olho as curvas de seu corpo
Enquanto você vê a mira do meu desejo

Estrelas piscam com o tremor do calor
Na face da terra coisas que os astros não influenciam
Mas que sentem calor derivado do tremor

Não percebemos a graça da coincidência
Até ser tarde demais no cançasso
& ver que tudo está em confluência

A tua boca & meu beijo honesto
A minha carência & a sua presença
A nossa disposição & a apatia do resto

Sabemos esperar, temos muito a querer
Nossa ânsia & paciência
Tudo vem, sabemos receber



13 de nov. de 2025

ConeX

 

Somos os homens
   destinados pelo caos
      para viverem nesses dias...
Cabe à consciência agora
   entender o que é existir
Em um mundo que se exauriu
   de todas as formas

Andamos na berlinda
   da transformação de tudo
Valores, cultural, crença, construções...
Logo os mais velhos se perguntarão
   onde foi parar a beleza, o amor,
      a serenidade
Enquanto os mais jovens perguntarão
   para que serve o luxo, a liberdade,
      a sociedade

Somos os homens
   aprisionados pela ordem
      para transviverem esses dias...
Cabe à consciência agora
   se anular em perceber
Que vida ficou ainda mais insignificante
   quanto mais criou-se conexões


 

12 de nov. de 2025

Fachada

 

Você é só fachada
Qualquer um é só fachada
Eu sou só fachada
   & uma hora todo fingimento cai

Sempre há um medo maior
Sempre há um louco mais louco
Sempre há alguém fora de base
   para nos tirar da linha

Use ele o amor
Use ele a violência
Use ele o vexame
   que te fará perder a compostura

Uma hora a casa cai
Uma hora a roda quebra
Uma hora o espelho não mente
   & tudo vai por água abaixo

Então tem o dia do acerto
Tem a hora da verdade
Tem a vez do verme
   & toda a carne vira planta

É aí que você vê
Que apesar do seu esforço
No choque de realidade
   nada escapa da sua falta de controle



9 de nov. de 2025

Palavras Sós

 

Apaixonado
pelas
perdas
& pelo
que
nunca
se
teve
Saber-se
  só
  & ainda
  mais
  só
  depois
  da
  solidão
Enfim descobrir que se pode retirar o pó do fundo do poço & constatar que ele ficou um pouco mais fundo ainda...
& você
é
a
única
companhia
de
si
mesmo
O corpo descontinuado, o silêncio que outro não preenche mais, uma insanidade alheia faltando aqui, saudade até de sua tristeza...

  consigo 
  mesmo
  comigo
  disperso
  no
  fundo
  vácuo
  que
  se
  desdobrou
O mau bom da solidão é que ela não tem mais nada para dividir...



6 de nov. de 2025

Dias desses...

 

Como lidei com esse dia?
Oh! Sim! Hoje fui relapso
Fui vago
Obrigado! Bom dia!
Passaram canções por aqui...
Passaram os mesmos corpos...
...não passou você
Eu não me ultrapassei
Trapaça
Eu ouvi nos entresons
"A felicidade é uma arma quente..."
Eu sei disso
Pela minha carne fofa que enrijece
Inflada de sangue & sede
A solidão não divide nada, aprendi
Eu li, eu sei
Esse dessaber insuficiente
Para me fazer eficiente
É porque eu desisti cedo, antes de decidir
De lidar com esse dia...

Como lidei com esse dia?
Oh! Sim! Senti muita falta de alguém
Fui esvaziado
Boa tarde! De nada!
Passaram silêncios por aqui
Passaram corpos desconhecidos
Não passou você
Eu não! Me ultrapassei
Sinceridade
Eu li nas entrelinhas
"A tristeza é uma arma fria..."
Eu sei disso
Pela minha carne mole esvaziada
Oca de desejo
A solidão não acrescenta nada
Eu ouvi, eu ignoro
Essa benção que não aconteceu
Para me fazer insuficiente
É porque eu decidi cedo, não desisti
De não lidar com esse dia...



5 de nov. de 2025

ªnormal

 

em um dia como esse
eu apelo ao cru
aproximo-me da paz da brutalidade
nessa adicção de anulação

pareço até um homem novo
em um lugar em que nunca estive
arredio... inconsolado...

parece a percepção
que o cérebro processa
ao revés
...me expelindo do real
... ...em um desassossego normal



4 de nov. de 2025

Apego

 

Poderia se dizer
   que em uma realidade
      onde tudo se faz presente,
Construímos um mundo
   onde nada é alcançado!

Irônico movimento da mente
   neste lugar presente
      para ela, esquecer,
         não é não querer
& para o corpo
   atravessando essas distâncias
      de tempo, lugar, solidão
   arruinado
      pois, não ter,
         não significa
            esquecer