"...
Construí canais estradas viadutos
ferrovias funiculares pontes túneis
até o palácio;
depois, áditos pórticos limiares
entradas
..."
Antônio Cícero, "Minos"
Rota ∞
Eu sonhei com uma estrada longa
ampla & pouco movimentada
Nela eu não viajava
simplesmente ia acelerando
matéria no tempo-espaço do sonho
Eu sonhei com uma estrada aberta
não havia placas, nem faixas na pista
& nem encruzilhadas
Sonhei que corria livre
sem medo da velocidade
& por vezes passava por gente
que labutavam na beira da estrada
como se na sua margem
estivessem atados
Eles & eu estávamos
em lugar nenhum dessa estrada
eu em movimento, eles estacionados
& eu corria sem parar sobre o asfalto
mas enfim chegava a hora de voltar
Eu fazia um retorno indolente
& acelerava mais
Porque parecia que ir & vir nessa estrada
era o mesmo...
...era
...estar
...em um
...caminho
...sem partida ou chegada...
___
Dédalo
Ida~Dia~Adia
...estrada sem saída...
Sonho na noite, mas no sonho era dia
...estrada que me adia...
Sonho, mas o sonho já é minha lenda
...estrada part/ida...
Sonho que me une ao meu mito
...estrada vadia...
Vida ida, sonho vindo, estrada infinda
...estrada que emanei
mas não encontrei seu final...
___
Minos
Uma estrada aberta
Sem placas de sinalização
Uma estrada para se correr
Esconde só que ela é também um labirinto...
É uma estrada de sonho, reta, espalhada
Sem leis ou o medo de qualquer perigo
No sonho o perigo está em parar...
Como uma Minos sobreposta
onde o touro é a máquina
em que se cavalga
& as migalhas são os restos psíquicos
que se intrometem desde a realidade...
Eu transpasso esse labirinto amplo
para sanar toda imobilidade da alma
...pois a estrada para Minos
já faz parte do labirinto...
___
Oniria: Na beira da estrada/labirinto, Km 000
"Fui parar em um lugar, que apesar da ida, eu não tinha passado, & era um posto de parada. Havia um desses bares de beira de estrada, onde estacionei a moto que eu pilotava, com muito medo de ter ela roubada.
Era porque havia em volta um vilarejo, uma espécie de aglomerado populacional raquítico, bem pobre, onde na rua única, que era a própria estrada, pessoas nuas brigavam. Elas pareciam estarem sendo despejadas, & havia lixeiros & a polícia fazendo esse serviço.
Foi quando no bar, na lanchonete da beira de estrada, que se entrava tendo que pular o balcão, entrou um casal em estado maltrapilho, estavam nus & enrolados em um cobertor, mas ninguém se incomodou com esse estado. Entraram também outras pessoas, esses parecendo serem turista, um casal mais uma mulher, & como eu estava ali do lado de dentro da estranha entrada, uma das mulheres não quis pular o balcão de entrada, pois estava seminua também & não queria que eu a visse pulando o balcão, achei mais chato que constrangedor, pois ela era muito exuberante, com seios enormes & eu já imaginava a comer com os olhos, mas resisti & me virei de costas para ela entrar.
Depois disso, peguei a moto de novo, & voltei para estrada/labirinto..."
___
Preâmbulo ao Final
A estrada começa no barro seco
É uma estrada de terra, sua raiz
Eu já corro nela
pensando em um pescoço quebrado...
Quando vou seguindo
encontro o asfalto & abandono todo medo...
Ele mais parece
um derrame de lava negra seca
sobre o mundo
espalhado em forma de senda...
Percorro um breve pedaço
& a estrada se bifurca depois de um rio
Em um Y estilingado
& contorcido sobre seu eixo
um viaduto de aço conduz à escolha...
& nesse instante o sonho parece sofrer
para me fazer entrever
essa visão da bifurcação...
Desvencilhando da imagem dissonante
escolho a via da esquerda...
& o sonho da rota 8nfinita mito-poetizada
inicia-se como foi legada...
"Eu sonhei com uma estrada longa
ampla & pouco movimentada..."
"Não ocultei o monstro:
Jamais hei de ocultá-lo.
Jamais erguerei paredes
para vedá-lo às vistas dos
curiosos e maledicentes.
Jamais hei de exilá-lo.
Ao contrário:
plantei-o no trono do salão
central do palácio que ergui
para abrigá-lo, na capital do
meu reino, no umbigo desta
ilha que eu mesmo tornei
eixo do mundo.
Que para ele convirjam todos
os turistas, todas as rotas
marinhas, todas as linhas
aéreas, todos os cabos
submarinos, todas as redes
siderais."
Antônio Cícero, "Minos"
Nenhum comentário:
Postar um comentário